segunda-feira, 18 de outubro de 2010

*Carta

Aqui ta quase escuro, a luz quase não chega mas ele teima que eu sei o que ele sabe mesmo dizendo que não sei. Ele é teimoso e ciumento, protetor e às vezes cruel, mas sou ainda mais e é por isso que não nos amamos a mais. E é por isso que o amo ainda mais, e ao invés de me repelir, ele me trás o lado do imã que me une aquele. Mas ele não sabe do que eu sei, ou do que eu quero saber. Eu nunca sei se sinto o que é, ou que quero sentir.
As cartas de Wether à Carlota me fizeram despertar para o desejo que tenho tantas vezes ao dia de também escrever cartas, mas não somente pra Carlota.
Um dia escrevi na tua mão o que usam pra me significar, mas o que significou de verdade foi meu desejo de morar ali dentro. E o que você não sabe é que mesmo contendo ali, onde tem mais osso do que carne, tua resposta com o mesmo signo na minha mão, significou pra mim um desejo de também morar aqui.
As cores mornas na minha sala são tão mornas quanto as daquele lugar onde estávamos quando escrevi e que costumamos ficar juntos e adormecer durante anos até o monstro que nos liga a vida vir nos acordar e dizer tudo o que precisamos fazer para nos manter vivos e vivos aos outros. Daquele lugar onde confesso a mim meus segredos. É aquele mesmo lugar onde pude senti o momento exato da minha morte. É. Eu senti quando ela chegou me dizendo: -Olá! Sou eu mesma, toda tua certeza e força agora pertencem a mim. Ela me derrubou pelos meus olhos, por culpa dessa mania de viver procurando poesia em todo canto. A poesia deve ter feito um pacto com as forças ocultas, por isso ela consegue tudo o que quer e vive brincando com aqueles que terminam por precisar dela pra viver e sobreviver. Foi ela que levou a morte até mim. Foi sim!
Foi naquele exato momento em que abri os olhos e vi minha pela sobre a tua e tua entre a minha, quando vi que minha cor veste tão bem com a tua quanto tão bem me faz o cheio que inalo do teu corpo quando me pego desperta.
Foi ali que morri, naquela esquina entre o sonho e a vida que a morte e poesia se apoderaram de meu corpo e de meus pensamentos, me mataram e me deixaram aqui, assim, sem conseguir comandar mais nada e me sentindo mais viva do que nunca. E como o nunca é um lugar que não existe nem acontece, to mesmo é morta.
Só vivo quando te tenho em mim, porque nesse meu conto de fadas, tu es o príncipe único que consegue afasta-las de mim para me devolver a vida, a cor, o sopro que me traz o sorriso à boca e me devolve os olhos para que novamente eu veja nossos corpos se misturando e pintando aquele quadro de peles que tanto me alucina quando o encontro.
Enquanto me leio em Barthes, me encanto com as descobertas que me acontecem.
Em que lugar do corpo adverso devo ler minha verdade?
E a verdade existe? Até onde vai a minha e onde começa a tua? Até que ponto sou mandona e persuasiva e até onde vai tua inocência e começa tua fantasia.